INTRODUÇÃO
A sociedade brasileira transformou-se significativamente nos últimos
anos, tendo ocorrido avanços em diferentes setores do Estado. Além da
política e da economia, o processo evolutivo atingiu as relações
interpessoais, afinal de contas, mudaram-se conceitos e entendimentos
preexistentes.
A sociedade brasileira transformou-se significativamente nos últimos anos,
tendo ocorrido avanços em diferentes setores do Estado. Além da política e
da economia, o processo evolutivo atingiu as relações interpessoais, afinal
de contas, mudaram-se conceitos e entendimentos preexistentes.
Nesse contexto, é inegável que o acesso cada vez mais fácil à informação
trouxe como conseqüência significativas alterações às relações familiares,
que passaram a conviver com o incremento da liberdade sexual, a efetivação
da mulher no mercado de trabalho, entre outros.
Impulsionado pelas transformações sociais, o legislador passou a dar mais
atenção ao Direito de Família, seja na nova redação do Código Civil de 2002,
quando traz à tona, a partir do art. 1.723, o ordenamento acerca da união
estável, seja mediante o disposto no art. 3º da Lei nº 11.441/07, que
possibilita a realização de separação e divórcio consensuais por escritura
pública.
A implementação dessas medidas, por certo ainda insuficientes para atender a
demanda, evidencia a preocupação do legislador em adequar a norma positivada
às mudanças por que vem passando a sociedade.
No presente artigo, abordaremos aspectos destacados do Direito de Família,
em especial os institutos do casamento, da separação e do divórcio
consensuais, traçando, quanto a estes últimos, um paralelo entre o antigo e
o atual procedimento. Na mesma perspectiva, a situação do nascituro:
caracterização, conceituação e proteção frente à Lei nº 11.441/07, que, no
entanto, não faz referência expressa a esse ente em potencial.
Visa, portanto, este artigo explicitar o procedimento para a realização de
separação e divórcio consensuais na via administrativa e a posição do
nascituro frente à nova lei.
O CASAMENTO
Maria Helena Diniz ensina que casamento é o vínculo jurídico que se
estabelece entre um homem e uma mulher, com o fim de auxílio mútuo, material
e espiritual, de modo que a integração fisiopsíquica resulte na constituição
de uma família legitima.
Explicação mais simples seria a de que, pelo casamento, homem e mulher se
unem na forma da lei, objetivando constituir uma família.
Frise-se que se trata o casamento de modo legal de união, dada a necessária
observância de uma série de requisitos previstos em lei, para ser
considerado válido. Com efeito, aqueles que pretendem casar-se, devem
habilitar-se previamente para o casamento e, após a sua realização,
transcrevê-lo no Registro Civil das Pessoas Naturais.
Caso optem por união que desobedeça aos requisitos previstos em lei,
tratar-se-á de união estável, que se assemelha ao casamento em seus
objetivos, mas não quanto às formalidades e solenidades que lhe são
inerentes.
Venosa diz ser o casamento o centro do Direito de Família, do qual irradiam
as normas fundamentais que regem o instituto cuja importância avulta das
formalidades que antecedem a celebração e do ato material de conclusão,
consubstanciando-se em negocio jurídico que produz efeitos nas relações
entre os cônjuges, a quem cabe deveres recíprocos de assistência material e
espiritual, bem como para a criação da prole etc.
Muitos são os aspectos que poderiam ser destacados desse negócio jurídico,
que é o casamento, todavia, não é este o objetivo do artigo.
Levando-se em consideração que a temática central do trabalho diz respeito à
Lei nº 11.441/07, mais precisamente a possibilidade de realizar-se separação
e divorcio consensuais por meio de escritura pública, há que se abordar com
destaque a questão material de cada um dos institutos, assim como a
processualística adotada antes da entrada em vigor do diploma legal em
comento.
SEPARAÇÃO CONSENSUAL E DIVÓRCIO CONSENSUAL
Separação consensual é a que se dá por acordo de vontade entre os cônjuges (CC/2002,
art. 1.574) 4.
Com a separação consensual, extingue-se a sociedade conjugal, mas não o
vínculo entre os cônjuges. Nesse sentido, as pessoas separadas judicialmente
só poderão convolar novas núpcias com o rompimento desse vínculo, que ocorre
em duas hipóteses, apenas: a morte de um dos cônjuges ou o divórcio.
O Código Civil destaca, em seu art. 1.580, a modalidade dita conversão da
separação judicial em divórcio. Transcorrido um ano da sentença que houver
decretado a separação judicial, ou da decisão concessiva da medida cautelar
de separação de corpos, qualquer das partes poderá requerer a conversão da
separação judicial em divórcio.
O § 2º do art. 1.580 trata do chamado divórcio direto, que poderá ser
requerido no caso de comprovada separação de fato por mais de dois anos.
A LEI Nº 11.441/07
A Lei nº 11.441, de 4 de janeiro de 2007, passou a vigorar na data da sua
publicação (05.01.07), tendo como objetivo principal, no que se refere à
realização de separação e divórcio consensuais por escritura pública,
conferir maior celeridade a esses procedimentos, evitando-se o ingresso em
juízo.
A realização de separação e divórcio consensuais na via administrativa
tornou-se possível pelo acréscimo do art. 1.124-A ao Código de Processo
Civil, por força do art. 3º da Lei nº 11.441/07. Nesses casos, a escritura
pública deverá conter as disposições relativas à descrição e à partilha dos
bens comuns e à pensão alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada
pelo cônjuge de seu nome de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando
do casamento. Insta salientar que, para valer-se de tal procedimento, o
casal não poderá ter filhos menores ou incapazes, devendo, no entanto,
observar os requisitos legais quanto aos prazos.
Evidencia-se, portanto, que, no caso da separação consensual, deverá ser
respeitado o período de acomodação. Ou seja, os cônjuges têm de estar
casados há mais de um ano.
Quanto ao divórcio, será preciso aguardar o tempo estabelecido na norma para
pleitear-se o divórcio direto, a qual impõe um prazo superior a dois anos da
separação de fato, ou, no caso de conversão da separação judicial em
divórcio, que esta tenha acontecido há pelo menos um ano.
Importante regramento é o de que a escritura pública não dependerá de
homologação judicial, constituindo-se título hábil para o registro civil e o
imobiliário, dando-se, desta forma, efetividade ao novo procedimento e, por
conseqüência, amenizando-se a carga judiciária.
Ainda que não seja mais necessário o ingresso em juízo nos casos em análise,
a figura do advogado é indispensável, já que o tabelião lavrará a escritura
apenas se os contratantes estiverem assistidos por profissional da advocacia
cuja qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se
declararem pobres sob as penas da lei.
A SITUAÇÃO DO NASCITURO FRENTE À LEI Nº 11.441/07
O Código Civil Brasileiro, em seu art. 2º, assim dispõe:
A personalidade civil da pessoa começa do nascimento com vida; mas a lei põe
a salvo desde a concepção os direitos do nascituro.
Venosa ensina que "o nascituro é um ente já concebido que se distingue de
todo aquele que não foi ainda concebido e que poderá ser sujeito de direitos
no futuro, dependendo do nascimento, tratando-se de uma prole eventual".
O mesmo autor ressalta que a situação do nascituro remete à noção de direito
eventual, isto é, um direito em mera situação de potencialidade, de
formação, para quem ainda nem foi concebido.
Entretanto, a lei em comento não faz qualquer menção à situação da mulher
grávida que resolve separar-se de modo consensual. Ou seja: a lei é
lacunosa, uma vez que não afirma categoricamente que, na hipótese de
nascituro por ocasião da separação ou divórcio, o casal deverá buscar a
tutela do Judiciário, mas apenas que, havendo filhos menores e incapazes, o
procedimento será judicial.
O legislador dá destaque ao filho menor e/ou incapaz, esquecendo-se que no
rol dos incapazes insere-se a figura do nascituro.
Certamente, a doutrina e a jurisprudência trilharão o entendimento de que,
nos casos de ocorrência de gravidez, tanto a separação quanto o divórcio
consensual somente serão possíveis com a intervenção do Ministério Público e
do órgão julgador. Esta deverá ser a tendência, justamente por aquilo que
Venosa chama de direito eventual. Havendo para o nascituro uma expectativa
de direito, analogicamente, aplica-se-lhe a mesma regra incidente sobre o
menor ou incapaz. Em síntese, o procedimento será judicial.
Ainda segundo Venosa:
A posição do nascituro é peculiar, pois, possui, entre nós, um regime
protetivo no Direito Civil, embora ainda não tenha todos os requisitos da
personalidade. Desse modo, de acordo com nossa legislação, inclusive o Novo
Código Civil, embora o nascituro não seja considerado pessoa, tem a proteção
legal de seus direitos desde a concepção.
Tal posicionamento leva à conclusão de que, no caso de gestantes que queiram
separar-se ou divorciar-se consensualmente, o caminho a ser trilhado é o do
Judiciário.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A Lei nº 11.441/07 efetivamente trouxe benefícios à sociedade e ao Poder
Judiciário, com a permissão de separação e divórcio pela via administrativa,
quando houver consenso entre os cônjuges. De fato, nada melhor que pôr fim
ao casamento, quando não se verificam desavenças no âmbito familiar, por
meio de escritura pública lavrada no Registro de Notas, a qual se
constituirá título hábil para o registro civil e o imobiliário.
Tal situação não se faz temerária, dada a salvaguada da necessidade de
buscar-se o Judiciário nos casos em que o casal tiver filhos menores ou
incapazes. Melhor seria ter o legislador estabelecido apenas casais com
filhos incapazes, afinal de contas, os menores incluem-se neste rol.
De qualquer modo, chama atenção o fato de não se ter assegurado
expressamente ao nascituro a mesma proteção conferida aos menores e
incapazes. Entendemos, contudo, que, sendo o nascituro dotado de expectativa
de direito, possui igual prerrogativa que os menores e incapazes.
NOTAS
1 Art. 3º A Lei nº 5.869, de 1973 – Código de Processo Civil, passa a
vigorar acrescida do seguinte art. 1.124-A:
Art. 1.124-A. A separação consensual e o divórcio consensual, não havendo
filhos menores ou incapazes do casal, observados os requisitos legais quanto
aos prazos, poderão ser realizados por escritura pública, da qual constarão
as disposições relativas à descrição e à partilha dos bens comuns e à pensão
alimentícia e, ainda, ao acordo quanto à retomada pelo cônjuge de seu nome
de solteiro ou à manutenção do nome adotado quando se deu o casamento.
§ 1º A escritura não depende de homologação judicial e constitui título
hábil para o registro civil e o registro de imóveis.
§ 2º O tabelião somente lavrará a escritura se os contratantes estiverem
assistidos por advogado comum ou advogados de cada um deles, cuja
qualificação e assinatura constarão do ato notarial.
§ 3º A escritura e demais atos notariais serão gratuitos àqueles que se
declararem pobres sob as penas da lei.
2 Diniz, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, p. 33, 1999.
3 Venosa, Sílvio de Salvo. Direito Civil, p. 27, 2006.
4 Dar-se-á a separação judicial por mútuo consentimento dos cônjuges, se
forem casados por mais de um ano e o manifestarem perante o juiz, sendo por
ele devidamente homologada a convenção.
5 Venosa, Silvio de Salvo. Direito Civil, 2006.
1 Art. 3º da Lei nº 5.869, de 1973 – C
Luis Gustavo dos Santos é Advogado em Santa Catarina. Especialista em
Direito e Organizações Públicas e Privadas pela Universidade do Vale do
Itajaí. Mestrando em Ciência Jurídica pela mesma universidade. Professor de
Direito Civil em cursos para concursos públicos e Exame de Ordem.
Revista Jurídica Consulex nº 264 |