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    Não se pode jamais esquecer que o procedimento de inventário se presta a 
    contabilizar patrimônio pessoal formado durante uma vida inteira de relações 
    profissionais, negociais e pessoais que criam, não raramente, obstáculos 
    transponíveis com maior facilidade mediante a atuação do Poder Judiciário 
     
    
    Eduardo Augusto da Silveira - Advogado, sócio da Silveira, Fonseca e 
    Cerqueira Advogados associados, especialista em direito tributário e do 
    consumidor 
     
    Depois de quatro anos de vigência da Lei 11.441/07, que introduziu a 
    possibilidade de realização do procedimento administrativo de inventário, 
    podemos, finalmente, dizer que restam vencidas as dúvidas e dificuldades 
    naturais postas pelo novel modelo. A saber, o diploma conferiu aos herdeiros 
    a faculdade da realização do inventário extrajudicial, mediante escritura 
    pública, desde que sejam estes capazes, estejam concordes e não tenha o 
    autor da herança deixado testamento.  
     
    Nada obstante, é necessário dizer que a via judicial é e será sempre caminho 
    a ser escolhido caso assim decidam dos herdeiros. É via obrigatória, 
    entretanto, em caso de existência de testamento, incapacidade ou menoridade 
    de herdeiro ou, ainda, litígio entre aqueles.  
     
    A Resolução 35 do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) regulamentou a 
    aplicação da lei pelos serviços notariais e de registro, consignando, entre 
    outros dispositivos, que as escrituras públicas de inventário e partilha não 
    dependam de homologação judicial para que surtam efeitos, constituindo, 
    pois, título hábil para o registro civil e imobiliário, transferência de 
    bens e direitos e levantamento de valores. 
     
    Disse, ainda, que a escolha do tabelião de notas é livre, não sendo, 
    destarte, aplicáveis as regras de competência do Código de Processo Civil 
    (CPC). 
     
    As partes, que deverão estar necessariamente assistidas por advogado, 
    deverão apresentar ao tabelionato comprovação de pagamento dos tributos 
    relativos aos bens do espólio e as suas rendas, efetuar o pagamento do ITCD 
    (imposto estadual incidente), recolher as custas e emolumentos, bem como, 
    finalmente, nomear representante com poderes de inventariante para 
    representar ativa e passivamente o espólio, inclusive judicialmente. 
     
    Diversos são os benefícios da forma extrajudicial do inventário/partilha. 
    Inicialmente, principalmente considerando os altos níveis de litigiosidade 
    ora verificados na sociedade brasileira, devemos louvar toda e qualquer 
    iniciativa do legislador de valorizar o consenso, o acordo; enfim, a 
    conciliação.  
     
    Ainda tratando dos benefícios sociais e, portanto, abstratos, a faculdade de 
    optar pela via administrativa desafoga o Poder Judiciário, notoriamente 
    assoberbado de ações e carente de recursos e estrutura que possibilitem a 
    efetiva prestação jurisdicional em tempo razoável. Entre os profissionais do 
    direito, é tida e reconhecida a máxima que diz: “Processo é aquilo que 
    corre, mas não anda”.  
     
    Por essas e outras razões, a via administrativa permite um trâmite mais 
    célere, o que, decerto, traz benefícios financeiros e emocionais aos 
    herdeiros. A ressalva fica por conta das particularidades das diversas 
    situações que compõem a apuração patrimonial pos mortem. Não se pode jamais 
    esquecer que o procedimento de inventário se presta a contabilizar 
    patrimônio pessoal formado durante uma vida inteira de relações 
    profissionais, negociais e pessoais que criam, não raramente, obstáculos 
    transponíveis com maior facilidade mediante a atuação do Poder Judiciário. 
    Portanto, inventários cujo trâmite dependam da expedição de ofícios, a 
    exemplo, são mais afetos à prestação jurisdicional.  
     
    Nada obstante, cumpridos os requisitos legais, a via administrativa é sempre 
    possível. Para tanto, é aconselhável que as partes escolham um herdeiro para 
    assumir a condição de representante do espólio, exercendo, assim, função de 
    inventariante, lavrando, ab initio, escritura pública declaratória para 
    possibilitar a representação do espólio, assim como a defesa de seus 
    interesses, judicial ou extrajudicialmente. 
     
    Nomeado o representante do espólio, mediante a supracitada escritura pública 
    declaratória, preferencialmente expedida pelo mesmo cartório de notas, 
    poderá (e deverá) este imprimir todas as diligencias necessárias ao efetivo 
    implemento do procedimento até sua conclusão, com a lavratura da escritura 
    pública de inventário e partilha definitiva.  
     
    Outro ponto relevante diz respeito à apuração e pagamento do tributo 
    pertinente, o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCD), cuja 
    certidão de quitação é pressuposto para a lavratura da escritura. No caso do 
    estado de Minas Gerais, a exação deve ser apurada e paga no prazo de 180 
    dias, contados da abertura do inventário, ou seja, da morte do 
    inventariando. Em nossa avaliação, o prazo é curto, especialmente quando 
    consideramos o período natural de luto e as dificuldades de, consoante 
    acima, promover a apuração do patrimônio, base de cálculo do tributo.  
     
    Cabe ao profissional do direito alertar as partes de que renúncias são 
    interpretadas pelo fisco como doação, igualmente hipótese de incidência do 
    ITCD, assim como, aliás, a estipulação de usufruto. E que não se questione a 
    segurança jurídica do procedimento extrajudicial. Em combate a tão comum 
    preconceito, é dever do tabelião zelar pela integral aplicação da lei e dos 
    princípios aplicáveis, negando-se a lavrar a escritura caso existam fundados 
    indícios de fraude, dúvidas sobre a declaração de vontade de qualquer 
    herdeiro, fundamentando sua recusa por escrito (artigo 32 da Resolução 
    35/07). 
     
    Mais ainda, pode-se entender que o advogado contratado pelas partes exerce a 
    atividade de assistir e orientar seus clientes sob o pálio dos princípios da 
    ética profissional, legalmente estabelecidos pelo Estatuto da Advocacia, 
    sendo, neste norte, igualmente responsável pela idoneidade de todo o 
    procedimento 
     
    Portanto, entendemos que, sempre que satisfeitos os requisitos, a forma 
    extrajudicial de inventário/partilha deve ser adotada pelos herdeiros em 
    homenagem à simplicidade, à praticidade, a celeridade e à cidadania.  
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