A revisão de contrato somente é admitida se o acontecimento que torna
excessivamente onerosa a prestação de uma das partes se apresente como
extrema vantagem para o contratante. A decisão é da Terceira Turma do
Superior Tribunal de Justiça (STJ), que acolheu o pedido de uma empresa
agrícola para que o contrato inicial, feito com produtor de soja, seja
mantido. Ao analisar a questão, a Turma entendeu que o produtor, ao fixar o
preço, certamente foi cauteloso em computar seus gastos e seu lucro
razoável, de modo que, em vez de experimentar prejuízo com a alienação
antecipada assegurou o ganho. A decisão é unânime, e segue entendimento da
ministra Nancy Andrighi, relatora do caso.
Segundo dados do processo, nos dias 10 e 15 de maio de 2002, a empresa e o
produtor celebraram contratos de venda e compra de safra futura de soja a
preço certo. A entrega da mercadoria foi combinada, respectivamente, para 30
de março e 3 de maio de 2003, ao preço de R$ 21,00 e R$ 23,00 por saca de 60
quilos.
Ao argumento de terem sobrevindo acontecimentos imprevisíveis, como a
eleição presidencial e a iminência de guerra no Oriente Médio, fatores que
teriam ocasionado a elevação extraordinária do dólar frente ao real, o
produtor ajuizou ação revisional de cláusulas contratuais, com pedido de
tutela antecipada, contra a empresa. De acordo com ele, sua obrigação
tornou-se excessivamente onerosa. Na ação, o produtor pedia a revisão dos
contratos, para que a empresa fosse obrigada a pagar R$ 34,50 por cada saca
de soja ou que sua obrigação fosse satisfeita pela entrega de apenas 2.136
sacas de soja, ao invés das três mil contratadas, mantendo-se o preço
originalmente fechado.
A antecipação de tutela foi negada e, em primeira instância, o pedido foi
negado, mantendo inalterados os termos do contrato. O juízo entendeu que o
contrato de comercialização antecipada é uma modalidade de venda a termo na
qual a aleatoriedade é a sua essência. O produtor não era obrigado a
comercializar a soja por este meio, mas se o fez, foi com a certeza de que o
negócio lhe renderia os lucros esperados.
O produtor apelou da sentença. O Tribunal de Justiça de Goiás (TJ/GO) deu
provimento à apelação. Para o TJ nos contratos de execução continuada, se a
prestação de uma das partes se torna excessivamente onerosa, com extrema
vantagens para a outra, em virtude de acontecimentos extraordinários e
imprevisíveis, poderá o devedor pedir a resolução do contrato, os defeitos
da sentença que o decretar retroagirão à data da citação.
Inconformada, a empresa recorreu ao STJ argumentando que a decisão ofendeu
artigos do Código Civil, bem como divergiu da jurisprudência de outros
Tribunais, ao decidir pela revisão do contrato em questão. Além disso,
alegou que não há no processo provas que sustentem os fundamentos do acórdão
do tribunal goiano.
Em sua decisão, a ministra Nancy Andrighi destacou que os riscos assumidos
pelas partes quanto à variação do preço da mercadoria decorrem da própria
natureza do contrato de venda e compra da safra futura a preço certo. Na
data em que eles firmaram contrato, além da livre oscilação do dólar ser uma
realidade de mercado, a ocorrência de altas e baixas, na cotação da moeda,
sobretudo no longo prazo, era uma circunstância presumível, inclusive diante
do cenário de eleições presidenciais e de eminência de confrontos armados no
Oriente Médio.
Por fim, a ministra ressaltou que, ao assegurar a venda de sua colheita
futura, é de se esperar que o produtor inclua nos seus cálculos todos os
custos em que poderá incorrer, tanto os decorrentes dos próprios termos do
contrato, como aqueles derivados das condições da lavoura.
Autor: Marcela Rosa
Processos: Resp 803481
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