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    A Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) definiu duas teses 
    referentes à responsabilidade de bancos na cobrança de duplicatas 
    endossadas. Os dois casos julgados como representativos de controvérsia 
    repetitiva envolviam o Banco do Brasil (BB). As matérias com tese fixada são 
    a culpa do endossatário em caso de endosso-mandato e de endosso translativo.
     
     
    Endosso-mandato  
     
    No REsp 1.063.474, o BB alegou não ter responsabilidade pelo protesto tido 
    como indevido da duplicata. Ao julgar a questão, o ministro Luis Felipe 
    Salomão, acompanhado pela unanimidade da Segunda Seção, definiu a seguinte 
    tese: “Só responde por danos materiais e morais o endossatário que recebe 
    título de crédito por endosso-mandato e o leva a protesto, se extrapola os 
    poderes de mandatário ou em razão de ato culposo próprio, como no caso de 
    apontamento depois da ciência acerca do pagamento anterior ou da falta de 
    higidez da cártula.”  
     
    Segundo o relator, o endosso-mandato é espécie de endosso impróprio, 
    modalidade pela qual o endossante (credor) encarrega o endossatário (o 
    banco) dos atos necessários para o recebimento dos valores representados no 
    título, transferindo a este apenas seus direitos cambiais. Conforme o 
    ministro, esse tipo de ato é forma simplificada de outorga de mandato, 
    exclusivamente cambial e concretizada por cláusula no próprio título.  
     
    “É o endosso a que faz menção o artigo 18 da Lei Uniforme de Genebra, 
    relativa a nota promissória e letra de câmbio”, indicou. “Disposição 
    semelhante é encontrada no artigo 26 da Lei do Cheque (Lei 7.357/85) e 
    artigo 917 do Código Civil de 2002”, completou. Nesse tipo de endosso, a 
    instituição financeira age não em nome próprio, mas do endossante. Por esse 
    motivo é que o devedor pode opor exceções pessoais que tiver contra o 
    endossante, mas nunca contra o endossatário.  
     
    Dessa forma, concluiu o ministro, o endossatário-mandatário responde por 
    eventual culpa nos moldes do direito civil comum relativo aos mandatos, por 
    exemplo ao extrapolar dos poderes outorgados ou agir com negligência, como 
    na hipótese de protestar título que já tinha ciência de ser inválido ou 
    estar quitado.  
     
    No caso concreto, porém, o BB não obteve êxito. O recurso foi negado porque 
    o banco recebeu duplicata não aceita e sem nenhum comprovante da entrega da 
    mercadoria ou da prestação de serviço, mas a protestou mesmo assim. Para a 
    Seção, o título claramente não apresentava condições de exigibilidade, o que 
    demonstraria a atuação negligente do banco na posição de 
    endossatário-mandatário. A indenização devida ao suposto devedor foi mantida 
    em R$ 7,6 mil, mais correção e juros.  
     
    Endosso translativo 
     
    A segunda tese foi definida no REsp 1.213.256. Nele, a Seção consolidou o 
    entendimento de que “o endossatário que recebe, por endosso translativo, 
    título de crédito contendo vício formal, inexistente a causa para conferir 
    lastro à emissão de duplicata, responde pelos danos causados diante de 
    protesto indevido, ressalvado seu direito de regresso contra os endossantes 
    e avalistas”.  
     
    O ministro Salomão explicou que, nessa hipótese, o endosso é pleno e 
    próprio: o endossador transfere ao endossatário o título e todos os direitos 
    nele incorporados. O relator esclareceu também a diferença entre a duplicata 
    “fria” (sem causa ou simulada) e aquela que teve origem em negócio desfeito 
    ou descumprido.  
     
    Segundo o ministro, apesar de manter vínculo com a causa de origem para ser 
    emitida, a circulação da duplicata mercantil, principalmente depois do 
    aceite do sacado, é regida pelo princípio da abstração. Isto é, a duplicata 
    se desliga da causa original ao circular no mercado. Por isso são 
    inoponíveis exceções pessoais a terceiros de boa-fé, como é o caso do 
    desfazimento do negócio jurídico que deu lastro inicial à emissão do título.
     
     
    “O que confere lastro à duplicata mercantil que conta com ‘aceite’, como 
    título de crédito apto à circulação, é apenas a existência do negócio 
    jurídico subjacente, e não o seu adimplemento”, apontou o relator. “Coisa 
    bem distinta é a inexistência de contrato de venda mercantil ou de prestação 
    de serviços subjacente ao título de crédito – portanto, emitido sem lastro, 
    hipótese em que há caracterização da simulação ou emissão de duplicata 
    ‘fria’, prática, inclusive, considerada crime”, alertou o ministro Luis 
    Felipe Salomão.  
     
    Para o relator, nessa situação, a inexistência do negócio que supostamente 
    dá lastro ao título pode ser verificada pelo endossatário, pela falta do 
    aceite ou do comprovante de entrega de mercadoria ou de prestação do 
    serviço. Nessa hipótese, afirmou, o banco não pode protestar o título nem 
    mesmo para se resguardar em futura ação de regresso contra o endossante, 
    porque, ao receber título evidentemente sem causa, assumiu os riscos da 
    inadimplência.  
     
    No caso concreto, o BB também não conseguiu decisão favorável. Para o 
    ministro, ficou claro na sentença que as duplicatas protestadas não foram 
    aceitas pelo devedor, nem houve prova de entrega das mercadorias. “Assim, 
    cuida-se de genuínas duplicatas sem causa, cujo recebimento por endosso 
    translativo transfere ao endossatário os riscos de intempéries relativas ao 
    título recebido, inclusive o risco de protesto indevido”, concluiu.  
     
    Pelo protesto, o BB foi condenado a indenizar o autor da ação em dez 
    salários mínimos vigentes à época da sentença, acrescidos de correção e 
    juros.  
     
    
    REsp 1063474 
     
    
    REsp 1213256  
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